Escrito pelo historiador da ciência Michael Shermer com título Ensine ciência a seu filho, mas o subtítulo que o complementa é ainda mais estimulante: ‘Torne a ciência divertida para vocês dois’ (JSN Editora, 2011). Se você é pai/mãe interessada /a nessa questão ou professor/a de ciências, vale a pena investir nessa aquisição.
Além de historiador de ciência, Shermer é psicólogo experimental de formação e fundador da Skeptics Society e da Skeptic Magazine, o que dá às suas ideias sobre o que é e como ensinar ciências um tom muito especial. Shermer também é pai, o que, segundo ele próprio revela no livro, lhe dá a oportunidade de testar suas ideias em sua filha – sem, é obvio, “considerá-la um rato de laboratório”, ironiza.
Entre as muitas dicas que Shermer dá sobre educação e, em particular, sobre a educação para a ciência, logo se destacam algumas preciosidades – e, como é do estilo do autor, sempre acompanhadas de muita crítica.
Diz Shermer, já na introdução de seu livro, que a ciência na infância deve ser apresentada de forma sutil e não intrusiva, sem se pressionar os filhos nem introduzi-los em programas educacionais ditos avançados, que prometem conferir-lhes vantagens iniciais ou garantir o acesso à universidade o mais precocemente possível.
“Que diferença faz alguém obter o diploma aos 21 ou 22 anos, ou se formar em medicina aos 28 ou 29? Nenhuma, a menos que seu filho não estivesse pronto quando você o orientou na carreira escolhida, e, se isso aconteceu, seus planos podem dar errado de qualquer forma. Talvez seu filho não esteja pronto e experimente uma quantidade excessiva de fracassos e correspondentes frustrações. Nesse caso, ao pressioná-lo, você na verdade o está atrasando”, pondera o autor.
Em outras palavras, Shermer procura alertar os pais para uma tendência que também pode ser encontrada no Brasil em uma parcela (mais abonada) da população: escolher a escola e matricular o filho na pré-escola já preocupados e cheios de expectativas em relação ao vestibular.
“Essa escola prepara para o vestibular?” é a pergunta-chave que norteia a escolha da escola em muitos casos, sem que se tenha a preocupação também com outras dimensões da educação, como o prazer em aprender e até de frequentar o ambiente escolar.
“A última coisa que quero fazer como pai é empurrar a ciência goela abaixo de minha filha até que essa seja a última coisa que ela queira estudar na escola”, diz Shermer.
Fazendo nossas as palavras do autor e adaptando-as à realidade brasileira, bem poderíamos dizer: a última coisa que a parcela da população brasileira que pode escolher a escola de seus filhos deveria fazer é empurrar acriticamente um determinado tipo de escola (conteudista e voltada a um ultrapassado modelo de vestibular) goela abaixo de seus filhos, de forma a obter resultados que podem ser justamente o contrário do desejado – o desprezo pelo aprendido e o desprazer em estudar.
Como psicólogo, Shermer sabe que o prazer é um grande aliado do interesse e da motivação, e que esses dois componentes, por sua vez, são indispensáveis à aprendizagem. Por isso, aconselha em seu livro que os pais apresentem a ciência a seus filhos de maneira lúdica e desafiadora, como algo que, de fato, ela pode ser: divertida.
Um jogo para entender o mundo
Embora a ciência possa à primeira vista e ao leigo parecer difícil e intimidadora, Shermer defende que ela não trata apenas das coisas, mas é também “pensamento”. A ciência, diz ele, é “um jogo para entender o mundo, jogado segundo regras especiais”, que envolve habilidades de pensamento a serem desenvolvidas e o exercício de determinados valores.
O objetivo primordial não é, portanto, ensinar às crianças “o que pensar”, mas “como pensar (cientificamente)”, defende ele.
Veja no quadro a seguir um resumo e adaptação das ‘regras’ do jogo da ciência que Shermer indica em seu livro para serem ensinadas às crianças. Perceba que a maior parte dessas regras representam habilidades e valores. Ou, como diz o autor, “umas poucas habilidades básicas de pensamento”, a serem “adquiridas de maneira prática”.
Se gostar das regras, comece a praticá-las. Certamente, mal não vão fazer a seus filhos ou alunos. São regras que só admitem benefícios.
Regra 1 – Honestidade é a melhor política
É preciso ser íntegro e honesto. Não se pode trapacear nesse jogo e deve-se se esforçar para que tudo seja feito corretamente. Tenha consciência de que suas afirmações e resultados vão ser testados e repetidos por outros. Sua reputação nesse jogo, portanto, depende de sua honestidade.
Regra 2 – É proibido trapacear
Não se podem forjar resultados. Expectativas até participam desse jogo, mas suas crenças, esperanças e desejos estão fora.
Regra 3 – Não aceite a palavra de outra pessoa – verifique você mesmo
Duvide. Para responder suas próprias perguntas, não se baseie em argumentos de autoridades nem em verdades estabelecidas, por tradição ou mito.
Regra 4 – Use descobertas anteriores para melhorar o jogo
Aceite a mudança. As regras do jogo permanecem, mas aquilo que com ele se produz, inclusive o conhecimento, muda e melhora com o tempo.
Regra 5 – Tente encontrar respostas ‘naturais’ para as perguntas
Baseie-se em observações e no uso dos sentidos. Diante de afirmações, busque explicações naturais, deste mundo (não sobrenaturais).
Regra 6 – Resolva discussões com evidências, não com insultos
Neste jogo as discussões são positivas, baseadas na argumentação e na apresentação de dados e evidências, obtidos por observações, testes e experimentos. Não há censura, desrespeito pela opinião alheia ou ataques pessoais.
Regra 7 – Não considere nada certo
Nada pode ser afirmado como certeza ou provado. Há coisas prováveis e muito prováveis, mas 100% não existe nesse jogo.
Regra 8 – Não há segredos
Divulgue seus resultados, compartilhe com os outros jogadores o que fez, como fez e os resultados obtidos. Contar uns aos outros o que estão fazendo só melhora esse jogo.
Regra 9 – Admita seus erros
Errar é possível neste jogo. O importante é admitir e corrigir o erro, aprendendo com eles. Também se pode mudar de opinião, quando novas evidências se apresentam.
Fonte: Ciência Hoje Uol
Postado por: Adriano Luis